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Euroimmun News O que o diagnóstico laboratorial (e precoce) muda na vida de um paciente com ELA

O que o diagnóstico laboratorial (e precoce) muda na vida de um paciente com ELA

18 de Abril de 2023
Artigos & Matérias
Por Marco Orsini*, neurologista e membro titular da Academia Brasileira de Neurologia. É doutor em Neurologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e pós-doc pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPUB-UFRJ). Também é responsável pelo Conselh

A utilização de neurofilamentos de cadeia pesada para a chamada “biomarcação” da esclerose lateral amiotrófica é a grande discussão atual para aumentar a qualidade de vida dos pacientes

A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) pode ser definida como uma doença neurológica, progressiva e degenerativa que cursa com a depleção, ou seja, com a perda dos neurônios motores superiores e inferiores. Para a população em geral, trata-se de uma doença que afeta a medula espinhal e o encéfalo, causando sintomas como amiotrofia e fraqueza muscular até total confinamento ao leito. Padrões de respiração, deglutição e fala são comprometidos. O curso da doença, até o presente momento, é inexorável, com sobrevida variando entre  2 e 8 anos após o início dos sintomas. 

Aqui no Brasil ainda são poucos os estudos epidemiológicos que trazem dados quantitativos e qualitativos sobre o retrato da doença entre a população. No mundo todo, a prevalência de ELA é de cerca de 5 casos a cada 100.000 habitantes, enquanto um estudo nacional realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte e o Laboratório de Inovações Tecnológicas em Saúde da UFRN (LAIS/UFRN),  chegou a conclusão de que a prevalência e incidência no país é de 0,9 a 1,5 casos/100.000 e 0, 4 casos/100.000 a cada ano, respectivamente. 


O atual tratamento da ELA é paliativo e a estimativa é de que cerca de 30 mil pessoas vão a óbito anualmente por complicações da doença 


Nesse cenário, o diagnóstico da ELA é fundamental. Na maioria das vezes, em cerca de 80% dos casos, ele acontece de forma clínica, com a observação do comprometimento associado dessas duas populações de neurônios. Em outras, o médico neurologista precisa solicitar exames complementares para um alicerce adicional ao diagnóstico, entre eles a eletroneuromiografia, exames de neuroimagem e exames laboratoriais, feitos no soro do paciente. Em poucos casos, a retirada de líquido da medula espinhal (líquor) pode ser necessária. Em suspeita de casos genéticos, fazemos o DNA, que conta com aproximadamente mais de 66 mutações já descritas.  

Neurofilamentos e o diagnóstico de ELA

Emerge, atualmente, a utilização de neurofilamentos para o diagnóstico ou a chamada “biomarcação” da doença. Além de nos ajudar a gerenciar melhor a qualidade de vida, sobrevida e percalços da doença, o diagnóstico laboratorial pode permitir a introdução  precoce dos enfermos em estudos clínicos randomizados controlados, duplo cegos e em vários centros de pesquisa (Multicêntricos), que efetivamente consigam mudar a “marcha” degenerativa de evolução da ELA. Sendo assim, a busca de biomarcadores confiáveis e robustos para acelerar o diagnóstico de ELA e fornecer um meio de monitorar a progressão da doença é o que precisamos para trazer esperança e controle da doença. 


“Costumo dizer que os exames de neurofilamentos são importantes porque os pacientes precisam de respostas; a ciência precisa de tempo e a doença precisa de sinalizadores que possam ser úteis para que o diagnóstico não seja postergado”

Mas o que exatamente são os neurofilamentos? Vou tentar explicar de forma didática e recorrendo a uma analogia mais simplificada. Antes, porém, lembrem-se que a ELA é marcada por danificar o corpo dos neurônios motores. Entretanto, como nos cometas, existem a cauda do corpo dos neurônios que chamamos de axônio. 

Mais de 90% do volume da célula de um neurônio é captado pelos axônios, que funcionam como um típico sistema interruptor-fio condutor-lâmpada, precisando para isso de alicerces e energia. Os alicerces, portanto, são chamados de citoesqueleto, todos composto por três componentes estruturais principais: microtúbulos (o maior componente deles), filamentos intermediários ( os famosos neurofilamentos) e microfilamentos (o menor componente).

Os neurofilamentos ainda são subdivididos em quatro unidades: um neurofilamento de cadeia leve, média, de cadeia pesada e α-internexina no sistema nervoso central ou periférica no sistema nervoso periférico. São considerados biomarcadores, ou marcadores biológicos, para a Esclerose Lateral Amiotrófica porque é possível encontrá-los no sangue e no líquido cérebro-espinhal dos pacientes.  


Diagnóstico precoce é possível

Na ELA, além da morte do corpo do cometa (neurônio), existe uma destruição maciça na cauda que fornece energia (os axônios), que costumam morrer mais precocemente, um fato já comprovado em biópsias contendo neurônios motores: neles, os axônios encontram-se em grande número e degradados nas áreas que circundam a lesão. 


Na ELA, quando os axônios começam a morrer  - o que ocorre mais precocemente que os neurônios -, uma concentração altíssima de neurofilamentos é despejada no sangue e no líquido cérebro-espinhal

 O ponto-chave é que a ciência ainda não pode diferenciar esses níveis caracteristicamente altos de neurofilamentos entre a ELA e outras síndromes ou doenças neurodegenerativas.  No entanto, os pacientes que possuem diagnóstico clínico de ELA, em comparação com indivíduos “saudáveis” ou com outras doenças neurodegenerativas, têm apresentado níveis elevados tanto de neurofilamentos de cadeia leve quanto de cadeia pesada no sangue e maior ainda no líquor. 

Não posso, como médico e pesquisador, achar que os neurofilamentos são como “ovos de colombo”, pois ainda se faz necessário mais estudos aprofundados que busquem a confiabilidade das medições séricas em relação às medições do LCR, além de padronização de métodos analíticos (modelo próprio a ser seguido na investigação da doença). E confiabilidade  significa ausência de erro aleatório. Portanto, ainda deve haver regularidade no procedimento de execução de um estudo, especialmente porque o aumento de neurofilamentos não ocorre exclusivamente na ELA. 

Mas, se for possível padronizarmos os neurofilamentos para a ELA exclusivamente, posso dizer que será um enorme passo diagnóstico; algo que já ocorreu na genética, quando no início dos estudos haviam poucas mutações referenciadas e, hoje, já existem aproximadamente 66 comprovadamente referentes à ELA — quem sabe até mais nos próximos anos. 


Altíssimos níveis de neurofilamentos de cadeia leve e de cadeia pesada estão associados à forma agressiva da doença, ao rápido declínio funcional e à sobrevida mais curta 


O que esperar do futuro

Infelizmente os neurofilamentos não estão atualmente incluídos em algoritmos prognósticos da ELA, provavelmente pela fragilidade dos estudos existentes. Para que entendam melhor o ponto em que estamos sobre esse assunto, sugiro que leiam Benatar M, Zhang L, Wang L, et al. Validation of serum neurofilaments as prognostic and potential pharmacodynamic biomarkers for ALS. Neurology 2020, um estudo atual, com metodologia bem fechada e resultados animadores sobre neurofilamentos na ELA. 

Tudo na ciência tem seu tempo… A ciência de foguetes costuma ser aclamada como o maior trunfo da tecnologia, mas não é sempre que eles são liberados: não ao acaso, é preciso fazer testes e retestes antes de um lançamento acontecer de fato, do contrário, seria uma queima de cartuchos muito valiosos. E os neurofilamentos são uma espécie de foguetes nesse sentido.

Algumas vezes, podemos atropelar etapas por estarmos sedentos em ajudar pacientes com ELA. Nesse cenário devemos parar, reorganizar nossos pensamentos, para regredir ou avançar. A regressão também é um avanço. Creio em resultados muito promissores nos próximos anos.


*Depoimento de Marco Orsini concedido  à jornalista Renata Armas, da agência essense. Participou da busca de referências bibliográficas a médica formada pela Universidade de Iguaçu (UNIG) Jaqueline Fernandes do Nascimento.

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